A realidade sobre a Índia

Na Índia, país predominantemente hinduísta, os cristãos são de longe uma minoria. Eles têm sido perseguidos durante anos, e no estado de Orissa, local mais tenso do país, cerca de 50 pessoas perderam suas vidas em uma onda de violência que ocorreu em 2008. Como ocorre a perseguição dos cristãos indianos? Qual é a história desses cristãos? E como se preparam para enfrentar tamanha opressão? Escrito pelo jornalista Gerald Bruins. 
Nova Déli – Na Igreja Metodista Betel, localizada na cidade de Noida, que fica na capital superpopulosa de Nova Déli, os jovens são responsáveis pelas atividades da manhã. Eles lêem as Escrituras, fazem um período de adoração, usando guitarra e bateria, e cantando musicas compostas por eles mesmos. Certa manhã, além das coisas de costume, eles encenaram uma peça. De repente, alguns jovens com mantas enroladas na cabeça e com pedaços de madeira nas mãos invadiram a igreja e bateram no “pastor”, um jovem com uma vestimenta litúrgica. Alguns cristãos foram atirados no chão. O pastor arrastou-se até o microfone e com a voz sufocada citou as conhecidas palavras de Jesus: “Pai, perdoa-os, pois não sabem o que estão fazendo”. Esse é o modo que esses jovens encontraram para chamar atenção para a perseguição que seus irmãos cristãos têm enfrentado. Esse é o assunto que tem mais ocupado a mente dos cristãos indianos, principalmente, após a grande violência feita contra os cristãos do estado de Orissa em agosto, na qual se estima que cerca de 50 pessoas foram mortas, 4.500 casas e igrejas foram destruídas, e mais de 50 mil pessoas ficaram desalojadas. Na capital, os cristãos podem realizar suas atividades com total liberdade, mas em outras partes do grande país a situação é precária. É por isso que duzentos pastores, fundadores de igrejas e evangelistas de todos os lugares do país se encontraram secretamente, em algum lugar do norte da Índia, para um seminário chamado PFAT. Durante quatro dias cheios, os participantes receberam ensinamentos, na maioria dos casos pela primeira vez, sobre a perseguição de acordo com a perspectiva bíblica. Realizado pela equipe indiana da Portas Abertas Internacional, organização mundial que apoia os cristãos perseguidos, o seminário ainda abriu espaço para testemunhos pessoais. Após as discussões, geralmente os participantes chegavam à seguinte conclusão: acreditar em Jesus na Índia pode custar tudo: filhos, família, casa, igreja e até a própria vida. O fio condutor de todos os testemunhos contados eram os grupos de hindus extremistas, que apareciam do nada, cercavam os cristãos, os ameaçavam com pedaços de madeira e armas, e incendiavam suas casas e igrejas. É importante fazer uma clara distinção entre os extremistas e os hindus “comuns”, que em muitas regiões do país vivem pacificamente com cristãos e muçulmanos. O comportamento dos hinduístas radicais pode ser ilustrado através dos incidentes que envolvem Anil Kumar, pastor de uma igreja pentecostal. Ele lidera três comunidades que somam um total de 100 membros no norte do estado de Uttarakhand. No dia cinco de janeiro de 2008, ele foi ameaçado por telefone. Ordenaram que parasse os cultos da igreja. Alguns meses antes, a polícia o prendeu sob a acusação de “forçar conversões”, ou seja, de tentar converter hindus à fé cristã, o que é proibido em alguns estados indianos que possuem leis anticonversão. Depois disso, foi solto porque faltavam evidências. Alguns meses atrás, um grupo de hindus se juntou em frente à sua igreja, gritando e ofendendo os membros. Logo em seguida, enquanto o culto estava ocorrendo, houve um ataque à igreja. Eles espancaram os fieis, que fugiram de lá em pânico, alguns com as pernas quebradas, mas ainda assim, tiveram que correr. Kumar foi detido novamente e trancafiado durante vários dias. Enquanto me contava a história, o pastor começou a chorar, não por causa do sofrimento que passou, mas porque sob tamanha pressão, alguns se reconverteram ao hinduísmo. E por mais que os radicais estejam distribuindo um panfleto com sua foto, para tentar expulsá-lo da cidade, o pastor não pretende parar de fazer o que faz.
“Jesus está comigo. E abri um processo legal contra a polícia. Aprendi a defender meus direitos neste seminário”, afirma. 
Feridas à faca 
Raju Baria, o líder de uma igreja doméstica em uma cidade do estado de Madhya Pradesh, carrega no corpo sinais visíveis da perseguição. Alguns anos atrás, radicais hindus o esfaquearam repetidas vezes no braço, e o atingiram nas costas com uma espada. No hospital, o médico não quis socorrê-lo. “O médico disse que Jesus me curaria e me enviou de volta para a delegacia. Fiquei detido durante um mês, porque disseram que eu forçava as pessoas a se converterem. Aos poucos minhas feridas sararam.” Após sua libertação, o pastor transferiu o culto da igreja para a casa de um amigo. Mais uma vez os extremistas fizeram um ataque, atearam fogo na casa e duas crianças que estavam em pânico pularam em um poço e se afogaram. “Seis igrejas da região viraram cinzas”, ele comentou de maneira contida. Apesar da opressão, disse com lágrimas nos olhos que sua comunidade está crescendo. Como o pastor explica isso? “Continuamos a evangelizar e ocorreram muitas curas. Isso traz as pessoas a Jesus.” 
Muitas histórias de milagres são contadas no seminário. Antes de sua conversão, o pastor Prakash Jha do estado de Madya Pradesh era membro de um grupo extremista hindu. Ele até atacou igrejas e cristãos. “Uma organização fundamentalista fez uma lavagem cerebral em mim. Os líderes diziam que os cristãos eram chantagistas, que recebiam dinheiro de fora do país e forçavam os hindus a se converterem. Assim, nós tínhamos que fazer algo contra eles.”
Ele ganhou uma Bíblia de um amigo que se tornou cristão. Sem saber que tipo de livro havia recebido, começou a lê-lo. No evangelho de Mateus, leu que Jesus pediu que todos que estivessem cansados e sobrecarregados viessem a ele. Isso o aproximou da fé. Converteu-se após testemunhar uma oração que trouxe cura a uma mulher que havia sido mordida por um escorpião. Sua igreja está crescendo apesar da opressão, segundo o próprio relato, isso acontece por causa das muitas curas que têm ocorrido. A perseguição também vem da família, contam os participantes do seminário. O pai de Bhupendra Nath é um guru, da casta brâmane, a mais elevada. Ele poderia ter seguido os passos do sacerdócio hindu, mas seus amigos de escola falaram para ele sobre Jesus e ele aceitou a fé. “Imediatamente após a primeira oração que fiz, fui liberto de uma terrível dor de cabeça, que me incomodava já fazia muito tempo”, diz. 
Como uma tentativa de fazer com que voltasse ao hinduísmo, o pai ordenou que fizesse diversos rituais, mas ele recusou-se. As pessoas da cidade começaram a pressioná-lo a voltar à fé hindu, mas ele resistiu. “Então, meu pai ameaçou me matar e pagou alguns mercenários. Eu fugi da casa de meus pais com minha esposa e estou vivendo em um lugar secreto, bem longe da minha família. Isso me magoa muito. Sinto falta deles, mas agora vejo meus irmãos e irmãs da fé como família.” 
Orissa 
No seminário havia um grande número de ministros da Igreja Evangélica Luterana do distrito de Koraput, situado no estado de Orissa, o centro do pior ataque já realizado contra cristãos. Quando a violência começou na região de Kandhamal, a cerca de duzentos quilômetros de distância, os pastores pensaram que os ataques não os alcançariam, mas estavam errados. Após quatro dias, as multidões alcançaram Koraput também. O reverendo Sewak Ram conta como seu sogro, também pastor da Igreja Luterana, e sua esposa tiveram que fugir para a floresta, quando sua igreja foi incendiada. “Eles tiraram primeiro tudo o que estava lá dentro, desde roupas até o fogão a gás e as Bíblias, e as queimaram fora da igreja.” Seu amigo, o reverendo Mahesh Pramanik, ficou preso no fogo cruzado. De um lado, estava a multidão enfurecida de hinduístas; do outro, um grupo de jovens (os cristãos da cidade estavam divididos), que queriam defender a igreja. Com a ajuda da polícia, foi possível impedir o confronto. “Eu estava na frente do grupo cristão, com as mãos estendidas, e clamava para que eles não recorressem à violência. Isso deu certo, mas os hinduístas ainda assim incendiaram todas as igrejas.” No total, 25 lugares de culto foram incendiados na região, assim como um número desconhecido de casas. Sessenta famílias cristãs perderam tudo. “É surpreendente o fato de que não houve mortes nessa região”, diz Pramanik. “Os pastores nem ousam pensar em reconstrução, não há dinheiro para isso. No momento, fazemos os encontros debaixo de árvores ou em campos abertos.” Em outros lugares de Orissa, os cristãos enfrentaram um destino muito pior: cinquenta pessoas foram assassinadas, mas de acordo com um relatório do Partido Comunista da Índia (marxista-leninista), 500 pessoas podem ter sido mortas. Segundos os comunistas, há rumores que dizem que os fundamentalistas hindus foram instruídos a destruir as evidências e queimar os corpos. As imagens de cristãos carbonizados porque atearam fogo neles ou porque não conseguiram sair de suas casas e igrejas durante os ataques, são frequentes. O reverendo Abraham, da organização Full Gospel Trust, que trabalha entre as crianças pobres do norte da Índia, nasceu em Orissa. Ele visitou diversas vezes o distrito de Kandhamal, que foi fechado para a imprensa. “Muitas pessoas ficaram traumatizadas, poisperderam um ou mais membros de sua família ou suas casas, e porque os documentos das propriedades foram queimados também, será difícil para eles retornarem.” O fato de que as igrejas foram incendiadas não tem impedido que os cristãos se encontrem, seja em casa ou na floresta. “É estranho pensar que você pode destruir o cristianismo ao destruir igrejas. Os cultos das igrejas simplesmente continuam a ocorrer, não importa quão difíceis são as situações.” Das milhares de pessoas desabrigadas, um grande número está vivendo nos campos estabelecidos pelo governo. O pastor iniciou diversos projetos voltados para crianças: “Do ponto de vista emocional, elas estão muito feridas. Não podem ir à escola e estão condenadas ao ócio. Estamos desenvolvendo um projeto cheio de atividades.” Abraham ouviu diversos relatos de pessoas que foram forçadas a se reconverterem ao hinduísmo. “Rasparam o cabelo dos cristãos, os forçaram a oferecer cocos a entidades, a beber urina de vaca e fizeram o sinal hindu na testa deles”, descreve o pastor. Muitos cristãos em Orissa começaram a duvidar. Alguns já haviam perdido suas casas em um ataque em dezembro de 2007, e tinham acabado de reconstruí-las quando os hinduístas atacaram novamente e destruíram tudo. “Onde está Deus?”, alguns perguntam a si mesmos. Ore por eles e por todos os que foram forçados à reconversão ao hinduísmo, para que possam permanecer fieis a Jesus, mesmo que só no coração. 
* Para evitar o reconhecimento das pessoas envolvidas, os nomes foram alterados no presente artigo. 
Índia 
• Língua: Hindi
• Capital: Nova Deli
• Forma de governo: República federativa
• Religião: Hinduísmo (80,5%), Islamismo (13,4%), Cristianismo (2,3%), Siquismo (1,9%), Budismo (0,8%), Jainismo (0,4%) e outras religiões (0,6%)
• Área: 3.287.263 km2 
• População: 1.129.866,154 (2007), depois da China, a Índia é o país com a maior população do mundo 
O mito da Índia como uma nação cheia de paz
Na Índia, país predominantemente hindu, os cristãos são de longe uma minoria. Eles têm sido perseguidos durante anos, e no estado de Orissa, local mais tenso do país, cerca de 50 pessoas perderam suas vidas em uma onda de violência em 2008. Como ocorre a perseguição dos cristãos indianos? Qual é a história desses cristãos e como eles se preparam para enfrentar tamanha opressão? 
Nova Déli – Na Classificação de países por perseguição da Portas Abertas Internacional, a Índia esteve durante anos na trigésima colocação. Abhishek Singh*, diretor da Portas Abertas Índia foi entrevistado em 2008 e relatou a possibilidade de que em 2009 o país fosse subir algumas posições. De fato, a Índia alcançou a 22ª posição. Isso ocorreu por causa da onda de violência contra os cristãos do estado de Orissa. Muitas pessoas foram mortas e houve um grande número de roubos. Isso significou um aumento na perseguição aos cristãos, e dado ao grande número de relatos que chegaram a nós, temo que esse não seja o fim de tudo. A seguir leia a entrevista feita com ele. Por causa da violência, nós pensávamos que os cristãos da Índia estariam vivendo escondidos. Mas ainda é possível vê-los indo sem medo à igreja. Qual é a postura dos cristãos indianos? Em primeiro lugar, não se pode comparar a Índia com um país como a Coréia do Norte, que oprimi os cristãos e não dá a eles nenhum tipo posição social. O cristianismo não é legalmente proibido na Índia. Nossa constituição garante liberdade de consciência para todos e o direito de se escolher a religião que quiser. Então, os cristãos possuem direitos em nosso país. Além do mais, o cristianismo foi trazido para cá pelo apóstolo Tomé, e depois por colonialistas portugueses, holandeses e franceses, portanto, há séculos ele está presente no país. A Índia é um país democrático, mas infelizmente, na prática, a lei tem sido restringida em sua aplicação de modo a favorecer a maioria hindu, 80% da população, e desfavorecer minorias como a cristã ou islâmica. A quantidade de violência feita por extremistas contra cristãos é muito grande. Não se passa um dia sequer sem que haja dois ou três ataques contra os cristãos no país. Em muitos casos, a polícia, sob a influência dos hindus, não faz nada ou torna-se complacente. Em um livro de Ron Boyd MacMillan que trata sobre a perseguição de cristãos na Índia, ele diz que há quinze anos, hindus e cristãos ainda coexistiam pacificamente. Esse dado é preciso? Antes de tudo, vamos deixar claro que a maioria dos hindus é pacífica e quer viver em paz. Os cristãos têm progressivamente se tornado vítimas de uma ideologia fascista chamada Hindutva, que tem se desenvolvido em nosso país nos últimos 20 anos. Os que aderem essa doutrina estão tentando tornar a Índia um Estado hindu através da violência. O cristianismo nunca foi bem aceito na Índia, principalmente entre os nacionalistas que veem isso como um legado de nossa história colonial. Sempre houve incidentes violentos envolvendo cristãos. O primeiro ataque documentado contra um cristão ocorreu em 1964, quando um clérigo católico romano foi assassinado no estado de Bihar. A perseguição de cristãos decolou em 1998, quando o Partido Bharatiya Janata chegou ao poder. Na véspera de Natal daquele ano, os extremistas da cidade de Dangs, estado de Gujarat, incendiaram 25 igrejas. Em 1999, o evangelista australiano Graham Staines e seus dois filhos foram assassinados. Fundamentalistas hindus atearam fogo em seu carro enquanto ele dormia. Os cristãos são acusados de forçar hindus a se converter. Há alguma verdade nisso? Isso é um falso boato, espalhado pelos nacionalistas para envenenar as mentes dos indianos. Fazendo isso, eles incitam a população hindu contra os cristãos. Mas posso afirmar que nunca houve um caso sequer de conversão forçada que tenha sido provado até hoje em nenhuma corte indiana. É mentira! Apenas propaganda contrária. Após circularem as informações falsas, os extremistas hindus começam a atacar os cristãos e a incendiar casas e igrejas. Os cristãos são um alvo fácil, já que são uma minoria e geralmente não revidam. Eles fazem isso para tentar alcançar o objetivo final: um Estado hindu. Há algum caso de perseguição que seja sistemática? A violência contra os cristãos não ocorre através do trabalho desconexo e aleatório de alguns grupos extremistas. Há uma rede intimamente ligada de organizações hinduístas fundamentalistas. A BJP é o braço político do grupo Rashtriya Swayamsevak Sangh (RSS), uma organização abrangente que promove o ideal de uma nação somente para hinduístas. Existem pelo menos 47 outras organizações ligadas a ela, inclusive um sindicato de trabalhadores e o partido fundamentalista chamado VHP, que possui um departamento voltado para jovens. São os membros dessas organizações que fizeram os ataques a Orissa. Então, sim, os ataques aos cristãos são muito bem planejados e há todo um sistema atrás deles. Em Orissa, houve um surto de violência. Em quantos estados os cristãos sofrem perseguição? No presente momento, os cristãos estão sendo perseguidos por toda a Índia, com exceção dos estados do nordeste indiano, por exemplo, Nagaland, Mizoram e Meghalaya. Nos outros 25 estados, nos últimos meses foram relatados diversos ataques a igrejas e cristãos, alguns estados mais outros menos. Nossa preocupação é maior com os estados de Orissa, Madhya Pradesh, Chhattisgarh, Uttar Pradesh, Andhra Pradesh e Karnataka. Em dezembro de 2007, e em agosto de 2008, houve um surto de violência em Orissa, mas os ataques contra os cristãos estão acontecendo constantemente em toda a Índia. Eles nem sempre aparecem na mídia, mas não devem ser ignorados. Como você explica o surto de violência em Orissa? A violência ocorrida nesse estado é essencialmente resultado de uma campanha muito bem arquitetada por hinduístas extremistas, que foi inspirada pela ideologia Hindutva da RSS. Houve um preparo de 20 anos até que ela ocorresse. Swami Laxmanananda Saraswati foi assassinado por rebeldes maoístas, mas os cristãos foram culpados. A morte dele deu início aos ataques aos cristãos. Esse homem chegou a Orissa no final da década de 1960 para proclamar a filosofia nacionalista hinduísta entre os Kandha, que são tribos étnicas que praticam a religião animista. Ele os incitava contra os Pana e os Dalits ou intocáveis, que estão fora do sistema de castas e não possuem nenhum direito para o que quer que seja. Existem cristãos entre esses excluídos e, dessa maneira, iniciaram-se os conflitos nessa área. Esses dalits, que no sistema de castas sempre foram obrigados a realizar os piores trabalhos, têm progressivamente obtido sucesso ao alcançar posições mais altas. Eles estão crescendo e até estudando em outros estados, assim, Kandha estava perdendo o controle deles. Isso inflamou os extremistas ainda mais. Além disso, o número de cristãos na cidade mais afetada, Kandhamal, estava crescendo rapidamente. Os dalits estavam se convertendo em grande escala. E isso não estava acontecendo porque alguém os forçava a conversão, mas sim porque eles queriam seguir Jesus Cristo. Os hinduístas extremistas começaram uma campanha de ódio e inventaram a história de que todos que haviam se convertido o tinham feito sob pressão. E o governo de Orissa não fez nada a respeito, porque temia perder os votos dos hindus. O fato de que os cristãos defendiam os pobres e oprimidos, os dalits, não foi do gosto dos que estavam no poder, que geralmente eram os de castas altas. É impossível entender a Índia sem conhecer esse sistema que permeia toda a sociedade. A classe alta tem medo de perder seu poder. Apenas um incidente teve que ocorrer, nesse caso, a morte de Saraswati, para que ocorresse um surto de violência. Há um boato de que os hinduístas extremistas estão sendo pagos para cometer crimes. O que você sabe sobre isso? Não posso provar, mas os sinais de que isso ocorra são muito visíveis. Kandhamal, cidade de Orissa, é muito conhecida por suas plantações de gengibre e açafrão. Diversas empresas têm tentado tomar a terra das tribos para cultivar essas especiarias e para utilizá-la para outros propósitos. Mas os cristãos têm defendido os direitos desses nativos para que eles obtenham a posse de suas terras. Então, os empresários querem primeiro se livrar dos cristãos e em seguida dos proprietários das terras. Eu ouvi dizer que eles ofereceram dinheiro aos hinduístas extremistas: 100 mil rúpias pelo assassinato de um pastor, a mesma quantidade para a destruição de uma igreja e 50 mil rúpias para incendiar uma casa de cristão. Por que é que os extremistas fariam isso? Só fariam se pudessem ter algum lucro ao fazê-lo! No ocidente, a idéia dominante é que o huinduísmo é uma religião pacífica. Essa imagem deve ser revista? O fato de que é a Índia é uma nação pacífica é um mito persistente. A história de nosso país não se desenvolveu sem ter um momento sequer de paz. Na Índia, ao contrário dos países vizinhos, somente 1% da população é budista. Por quê? Há uma página negra em nossa história que ninguém quer contar: os líderes das castas mais altas assassinaram sistematicamente milhões de budistas. Nosso país possui a segunda maior população muçulmana do mundo, e muitos muçulmanos foram assassinados nos últimos anos. Gandhi, fundador de nosso Estado moderno, usou o mito de que a Índia era uma nação pacífica como meio de propagar o país no ocidente. Essa imagem foi criada no século XIX por um erudito alemão chamado Max Müller, que escreveu a partir de uma visão romantizada do hinduísmo. Mas a realidade é diferente: a Índia hindu é baseada em uma sociedade violenta. *Por motivos de segurança, o nome do entrevistado foi alterado. 
Cristãos indianos treinados e lutando por seus direitos
Na Índia, país predominantemente hinduísta, os cristãos são de longe uma minoria. Eles têm sido perseguidos durante anos, e no estado de Orissa, local mais tenso do país, cerca de 50 pessoas perderam suas vidas em uma onda de violência que ocorreu em 2008. Como ocorre a perseguição dos cristãos indianos? Qual é a história desses cristãos e como eles se preparam para enfrentar tamanha opressão? Nova Déli – Lemos na Bíblia, em 2 Timóteo 3.12, que os seguidores de Jesus serão perseguidos. Alguns cristãos perguntam a Deus se ele colocará um fim a opressão, mas isso não acontecerá. A oração certa é a que pede a Deus a força para permanecer firme. A perseguição na Índia é a prova de que a igreja está cumprindo a vontade de Jesus: a ordem de seguí-lo. As palavras duras de Abhishek Singh, diretor da Portas Abertas Índia, no início do seminário, tiveram um efeito rápido. Era como se os pregadores e pastores presentes fossem rudemente acordados com uma sacudida. “Incendiaram minha igreja, mas eu não estava preparado para enfrentar isso, de maneira alguma, e não conseguia entender por que tinha que acontecer com minha comunidade. Nunca pensei que a perseguição é parte vida diária de um cristão”, disse um pastor de Orissa. O objetivo primordial do seminário, que recebeu o nome em inglês de Standing Strong Through the Storm (SSTS) [Permanecendo Firmes através da Tempestade – PFAT], é equipar os cristãos a resistir à perseguição. Os pastores têm se disposto a enfrentar viagens de trem de até quatro dias para se encontrarem com os irmãos e irmãs. A maioria deles não teve qualquer tipo de educação formal, por isso, prestam muita atenção nas aulas, ouvem as histórias uns dos outros, encorajam-se entre si com palavras e canções que alegram o coração. A felicidade desses cristãos, apesar do sofrimento, das prisões, ofensas e perda de pessoas amadas, ilumina e impressiona os poucos ocidentais que participam do curso. Conhecer as histórias da Igreja Perseguida ao redor do mundo, contadas aos presentes por um membro da equipe da Portas Abertas Internacional, também traz encorajamento. 
“Vocês não estão sozinhos. Por todo o mundo, centenas de milhões de cristãos estão sofrendo perseguição”, disse o membro da Portas Abertas. Outro objetivo do seminário é gerar unidade entre os cristãos. Assim como em outros países, na Índia, os cristãos frequentam igrejas diferentes. Existem 38 denominações, desde a Igreja Católica Romana até a Igreja Luterana e Metodista. Os grupos evangélicos e pentecostais têm crescido rapidamente, principalmente em áreas rurais. O surto repentino de violência no país tem quebrado as barreiras denominacionais. 
“A unidade em Jesus é mais importante do que o fato de alguém ser católico ou batista”, disse Singh. 
O caminho da cruz 
A Portas Abertas Internacional ministra esse curso em muitos países onde os cristãos são perseguidos. Singh e a equipe realizam cerca de 70 seminários por ano, em todas as partes da gigantesca Índia. “Por causa do que houve em Orissa, os cristãos estão preocupados com a situação perigosa em que vivem. Mas eles estão preparados? Não, nem todos estão preparados. Não se esqueça de que a Índia é um país muito grande. Temos anos de trabalho a realizar”, disse Singh. Santosh Munna, teólogo formado, tenta dar luz à Bíblia no que diz respeito ao fenômeno da perseguição: “Jesus tomou o caminho até a cruz, nós devemos estar preparados para fazer o mesmo. Não há outro caminho. Se você diz na Índia que Jesus é um caminho, nem os extremistas se incomodam com isso. Mas se você diz que Jesus é o Caminho, aí então você cria problemas. Nós temos que nos apegar ao que a Bíblia diz a respeito de Jesus. Não há nada que diga que nosso caminhar ao longo da vida será um mar de rosas”. Ele ainda cita diversas afirmações de Jesus que demonstram que o sofrimento faz parte da vida cristã. Jesus disse em João 15.20: “Se me perseguiram, também perseguirão vocês”. Em Lucas 6.22, Jesus disse: “Bem-aventurados serão vocês quando os odiarem, expulsarem e insultarem, e eliminarem o nome de vocês, como sendo mau, por causa do Filho do homem”. Baseando-se na primeira carta de Pedro, ele declara que Deus permite o sofrimento e tem um propósito para ele. “Deus tem um plano para Orissa. Não conseguimos entendê-lo ainda, mas um dia o entenderemos.” Ele diz também que há uma benção no sofrimento em prol de Jesus, e no final de tudo, haverá vitória. “Nós, como pessoas, podemos ser impedidos de continuar, mas nada e ninguém pode conter Cristo e sua Igreja. A Igreja continuará a existir, não importa o que aconteça. Os cristãos podem proclamar essa vitória.” Mas como responder às ameaças de violência? É possível ter armas para se defender e sua família? Não há nenhuma dúvida de que o comportamento bíblico para essas circunstâncias é de que os cristãos nunca devem revidar, mas sim “dar a outra face”. Essa afirmação causa comentários e discussões no ambiente. “Sim, mas e se alguém está tentando cortar minha cabeça com uma espada? Eu realmente não tenho permissão de fugir?” Questionou um pastor. Outro pastor disse que os cristãos não devem em hipótese alguma ser violentos, nem mesmo quando tiverem que se defender. Certa vez, sua igreja foi cercada por um grupo de hinduístas radicais com pedaços de madeira e armas. Ele disse: “Começamos a ler a Bíblia e orar em voz alta. Quando os hinduístas ouviram, eles pensaram que estávamos em um grande grupo dentro da igreja, por isso, se amedrontaram e fugiram”. Imediatamente, um colega começa a contar uma história contrastante. Em sua comunidade, todos os membros da igreja, adultos ou jovens, receberam armas para defenderem a igreja. Quando os grupos extremistas ficam de frente com os cristãos armados, eles fogem. Quando falou isso, o teólogo disse: “Mas aí eles vão a outra igreja e incendeiam ela”. Tentando encontrar um meio-termo na discussão, ele disse ainda: “Se você vai se defender ou não, isso dependerá das circunstâncias. Mas uma coisa nunca deve acontecer. Você jamais deve se defender usando armas, nem mesmo se alguém for assassinado, porque nossa esperança está na ressurreição em Cristo”. “Amem seus inimigos e orem pelos que os perseguem,” ele falou citando Jesus em Mateus 5.44. 
Direitos 
Através do seminário, a Portas Abertas Internacional espera fazer com que os líderes pratiquem em casa o que aprenderam, de tal maneira que haja um efeito multiplicador. É por isso que o programa apresenta primeiramente e de forma resumida os assuntos dogmáticos, como por exemplo, a trindade, e só depois passa para o treinamento de liderança e para os elementos essenciais de ajuda a vítimas. Em Orissa, em 2008, a organização também realizou sessões de aconselhamento pós-trauma com os cristãos afetados. A maioria dos pastores tem somente a Bíblia, portanto, no final do curso, eles recebem trinta livros, desde comentários bíblicos até alguns livros teológicos básicos. Paralelamente a esse seminário, outro encontro também foi realizado em uma localidade diferente, sobre os direitos dos cristãos na Índia. Um dos preletores foi o advogado Ram Singh, de Orissa, sendo um dos poucos com formação legal na região. Ele admitiu que estava exausto por causa da quantidade de trabalho. O telefone toca sem parar. É verdade que os cristãos são minoria, mas sob a lei, eles têm tantos direitos quanto os hinduístas. 
“Mas na prática, eles fazem pouco uso disso, simplesmente porque não conhecem seus direitos”, disse Singh. Apoiado pela Portas Abertas Internacional, ele ensina aos cristãos que devem defender seus direitos. Os primeiros frutos são visíveis. Até agora, milhares de queixas oficiais foram apresentadas às delegacias de polícia. “De acordo com a lei, a polícia deve levar cada queixa a sério. Dessa maneira, nós os forçamos a fazer algo”. Para começar a pressionar as autoridades de Orissa a abrir os processos contra os criminosos e prover ajuda às vítimas, Singh e sua equipe submeteram um processo na corte mais alta do estado. Essa autoridade legal de alto escalão de Orissa pode forçar o governo a tomar alguma atitude. Por causa disso, mais policiais e militares foram solicitados, o que fez com que um segundo surto de violência, depois do assassinato de outro líder hindu, fosse impedido. No momento, centenas de extremistas hindus foram presos, segundo Singh. “Acho que quando tudo se resolver, cerca de 5.000 devem ser presos, ele afirma de forma otimista.” Apesar de todos esses sinais promissores, ninguém quer ou é capaz de dar uma declaração de como as coisas andarão em Orissa. Existem muitos problemas. Milhares de cristãos ainda estão vivendo em campos de refugiados. Somente um pequeno número de organizações, operando sob a direção da Cruz Vermelha, tem permissão de prover ajuda. Elas suprem as necessidades básicas, mas o inverno chegou e a situação tem se agravado. É muito difícil para muitos retornarem aos lares, porque os documentos de proprietários foram perdidos com suas casas. Singh diz que é uma tarefa difícil em termos legais. Os hindus extremistas fizeram seu trajeto de destruição em três semanas, mas a reconstrução demorará muito tempo. O diretor da Portas Abertas Índia disse: “Se não houver outro surto de violência contra os cristãos, a reconstrução pode demorar dez anos”. 
* Para evitar o reconhecimento das pessoas envolvidas, os nomes foram alterados no presente artigo. Tradução: Homero S. Chagas 

Dados gerais 
Capital
Nova Déli 
Governo
República federativa, chefiada pelo presidente Pratibha Patil desde julho de 2007
População
1,2 bilhão (28,7% urbana) 
Área
3.287.590 km2
Localização
Sul da Ásia 
Idiomas
Hindi, inglês e outras 21 línguas oficiais
Religião
Hinduísmo 80,5%, islamismo 13,4%, cristianismo 2,3%, siquismo 1,9%, outras 1,9%
Perseguição
Limitações severas
Restrições
Há liberdade de culto e de evangelização. Alguns Estados, no entanto, limitam essa liberdade quando aprovam leis anticonversão e quando não punem corretamente aqueles que perseguem as minorias
Missão PortasAbertas